quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Direito Penal: Combinação de Leis


Por: Felipe Augusto Barbosa Gomes.
Lex tertia (terceira lei) é o termo que designa a combinação de leis editadas em tempos distintos, relacionando-se, assim, com o tema da lei penal no tempo.
O ponto nevrálgico deste assunto reside no que se segue: com a superveniência de uma nova lei, seria possível, aos fatos ocorridos na vigência da antiga lei, aplicar benefícios da nova?
A doutrina e a jurisprudência discutem a possibilidade de se combinarem dispositivos de duas leis que se sucederam no tempo, cada qual com partes favoráveis e desfavoráveis, com vistas a criar uma terceira norma, mais favorável ao réu.
O STF, por algumas vezes, já se pronunciou sobre a combinação de leis, apresentando clara dissonância interpretativa. Deste modo, no julgamento do HC 95.435/RS, esta Egrégia Corte posicionou-se sobre a impossibilidade da combinação de leis penais, sob pena de se criar uma terceira lei, invadindo atribuições inerentes ao exercício do legislador, o que seria de todo inviável. Na oportunidade, cogitava-se de combinar a antiga Lei 6.368/76 com a nova lei de drogas (Lei 11.343/06). Entendia não ser possível a conjugação de partes mais benéficas de diferentes normas para se criar uma terceira lei, sob pena de ofensa aos princípios da legalidade e da separação de poderes, afirmando ainda, que a Constituição permitiria a retroatividade da lei penal para favorecer o réu, mas não mencionaria sua aplicação em partes.
De outro lado, o Min. Cezar Peluso frisou o teor do voto proferido pela 2ª Turma no julgamento do HC 95435/RS, no sentido de entender que a combinação das leis não significaria baralhar e confundir normas, uma vez que o juiz, ao assim proceder, não criaria lei nova, apenas se movimentaria dentro dos quadros legais para uma tarefa de integração perfeitamente possível. Realçou, ainda, que a vedação de convergência de dispositivos de leis diversas seria apenas produto de interpretação da doutrina e da jurisprudência, sem apoio direto em texto constitucional. O Min. Celso de Mello, a seu turno, acresceu que não se cuidaria, na espécie, da denominada “criação indireta da lei”. Ato contínuo, assinalou que, mesmo se fosse criação indireta, seria preciso observar que esse tema haveria de ser necessariamente examinado à luz do princípio constitucional da aplicabilidade da lei penal mais benéfica (RE 596152/SP, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Ayres Britto,13.10.2011).
Neste diapasão, parece-nos que, atualmente, o STF tende a adotar a teoria da ponderação diferenciada (que permite a aplicação de dispositivos de ambas as leis), em detrimento da teoria da ponderação unitária ou global (defende a aplicação da lei em sua totalidade).
O STJ, ao julgar questão idêntica, adotou posição que inadmite a combinação de leis penais. Limitou-se a facultar ao réu, após intimação do seu defensor, a escolha entre o regramento antigo e o atual, pois deve incidir em sua integralidade a legislação que melhor favorecer ao paciente, isto é, ou a lei nova ou a lei antiga, mas nunca partes de cada uma delas.
Assim como na jurisprudência, a doutrina também se diverge, existindo autores que defendem a possibilidade de mesclar partes benéficas de leis distintas (Nélson Hungria, Heleno Cláudio Fragoso e Aníbal Bruno), e outros entendendo pela impossibilidade (José Frederico Marques e Damásio E. de Jesus).
Por fim, insta ressaltar que o Código Penal Militar (Decreto-lei 1.001/1969) proíbe expressamente a combinação de leis (art. 2º, §2º).

2 comentários:

  1. E Se fosse responder essa questão: É possível a combinação de leis penais em favor do réu?

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  2. O autor do blog, por desatenção, inverteu os autores quanto à sua filiação doutrinaria. A doutrina clássica capitaneada pelo saudoso Nelson Hungria, consolidou entendimento, seguido de perto por nossos tribunais, no sentido da impossibilidade da combinação de duas normas para se extrair uma terceira mais benéfica. A propósito, a lição de Hungria: Cumpre advertir que não podem ser entrosados os dispositivos mais favoráveis da lex nova com os da lei antiga, pois, de outro modo, estaria o juiz arvorado em legislador, formando uma terceira lei, dissonante, no seu hibridismo, de qualquer das leis em jogo.

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